quinta-feira, 6 de julho de 2023

Robô-enfermeira é testada no Canadá e na Coreia do Sul

Grace, a robô-enfermeira que usa inteligência artificial para monitorar pacientes com idade avançada, interagir e fazer companhia a eles, deve ter o primeiro pedido de regulamentação apresentado à Food and Drig Administration (FDA), nos Estados Unidos, entre o fim do ano e o início de 2024, disse ao Valor Ben Goertzel, fundador e diretor-presidente da Singularity-NET, criadora da robô que está sendo testada em hospitais do Canadá e da Coreia do Sul.
"Estamos fazendo pesquisas sobre como a companhia pode elevar a qualidade de saúde de pessoas com idade avançada, que vivem sozinhas. É uma ótima notícia para seguradoras de saúde", disse Goertzel em entrevista ao Valor, após ter feito uma demonstração da Grace durante o Web Summit Rio, nesta quinta-feira, último dia do evento sobre inovação.
"Quando introduzi o termo AGI, em 2015, era algo obscuro", comentou Goertzel na apresentação. "Podemos estar há cinco ou seis anos de alcançar uma inteligência artificial mais 'humana'", projetou.
"O cientista ressalta que o objetivo da Grace não é substituir o contato humano com pacientes, mas diminuir as funções burocráticas dos profissionais humanos em tarefas como preenchimentos de prontuários médicos.
"O maior propósito não é substituir o contato humano, que sempre será importante, mas hoje vemos muitos profissionais da saúde preenchendo mais dados sobre os pacientes nos notebooks do que em contato humano com eles", ponderou o fundador da Singularity-NET, uma espécie de marketplace (shopping center) de inteligência artificial, baseado em tecnologia blockchain.
Estes são alguns trechos de uma notícia publicada na edição de 05 de maio de 2023 do jornal Valor.
"Estamos fazendo pesquisas sobre como a companhia pode elevar a qualidade de saúde de pessoas com idade avançada, que vivem sozinhas. 'É uma ótima notícia para seguradoras de saúde', disse Goertzel em entrevista ao Valor".
E ao dizer isso o fundador e diretor-presidente da Singularity-NET, criadora da robô, faz-me comparar sua afirmação com algo dito por Ricardo Barros, um empresário e político brasileiro que foi ministro da saúde no governo Temer. Algo que pode ser lido no próximo parágrafo, e que até a publicação desta postagem poderia ser ouvido no endereço (https://www.youtube.com/watch?v=B2XqF3aWobA&t=1s), a partir do final do 18º minuto.
"Os hospitais estão quase quebrando porque eles perderam no seu movimento normal as cirurgias eletivas, aquelas que não são emergenciais, os acidentes de trânsito caíram muito, também eram um motivo de faturamento dos hospitais e a covid não está ocupando na maioria do país os leitos. Então, nós estamos ainda quebrando todo o nosso sistema hospitalar financeiramente porque eles não podem fazer o seu trabalho normal e também não tem clientes covid em todo o país pra ocupar os leitos."
Será que a diminuição da quantidade de acidentes de trânsito e da insuficiência de clientes (sic) covid para ocupar os leitos dos hospitais deveria ser motivo para lamentação ou para comemoração? Depende. Depende de quê? Do ponto de vista. Do ponto de vista de seres humanos, deveria ser de comemoração. Do ponto de vista de seres monetários é motivo de lamentação. Do ponto de vista da saúde seria de comemoração. Do ponto de vista de instituições que, intituladas como sendo de saúde, mas que na verdade lucram é com doenças é motivo de lamentação. Será que é difícil enxergar que seres humanos e instituições intituladas como sendo de saúde têm interesses simplesmente opostos, ou seja, o que é bom para uns é ruim para os outros, e vice-versa.
Portanto, se, como disse o fundador e diretor-presidente da Singularity-NET, o que a companhia está fazendo "É uma ótima notícia para seguradoras de saúde", o mais provável é que para os segurados seja uma péssima notícia.
"O maior propósito não é substituir o contato humano, que sempre será importante, mas hoje vemos muitos profissionais da saúde preenchendo mais dados sobre os pacientes nos notebooks do que em contato humano com eles", ponderou o fundador da Singularity-NET, uma espécie de marketplace (shopping center) de inteligência artificial, baseado em tecnologia blockchain.
Em um mundo caracterizado pelo desprezo de uns pelos outros, na imensa maioria de tudo o que é feito, o maior propósito é algo que, no meu entender, jamais será revelado por quem o faz. Até porque em um mundo em que tudo foi transformado em negócio, há uma máxima que diz que "O segredo é a alma do negócio."
"Não o que caracteriza esta autodenominada espécie inteligente do universo não é a sinceridade, e para quem contestar esta afirmação, minha recomendação é que atentem para o seu apreço por algo denominado fake news.
Sim, como ponderou Ben Goertzel, é verdade que "hoje vemos muitos profissionais da saúde preenchendo mais dados sobre os pacientes nos notebooks do que em contato humano com eles". Ou seja, interagindo mais com máquinas do que com seres humanos. Tocando cada vez mais em máquinas do que em seres humanos.

Sim, como ponderou o fundador da Singularity-NET, o contato humano sempre será importante. E diante de tais ponderações fica, prá mim, difícil entender o que pretende o criador da robô-enfermeira. Até porque, no que se refere a contato humano, considero o papel das enfermeiras até mais importante que o dos próprios médicos. Consideração validada durante minha estada em um leito em um leito de UTI para receber tratamento para COVID. Não consigo enxergar robôs-enfermeiras fazendo o trabalho daquelas enfermeiras tão bem quanto elas. A postagem publicada no blog Espalhando ideias em 04 de outubro de 2021 é intitulada "Lição oferecida pela estada em um leito de UTI".

"Estamos fazendo pesquisas sobre como a companhia pode elevar a qualidade de saúde de pessoas com idade avançada, que vivem sozinhas.", diz Ben Goertzel, fundador e diretor-presidente da Singularity-NET, criadora da robô-enfermeira.
Pesquisas que, infelizmente, são feitas considerando que todo e qualquer problema que aflige o ser humano pode ser solucionado ignorando o aspecto humano e levando em conta apenas o aspecto técnico. Pesquisas que parecem-me desconhecer e / ou ignorar uma recomendação de Carl Gustav Jung (1875 – 1961), psiquiatra e psicoterapeuta suíço, fundador da psicologia analítica que, no meu entender, jamais deveria ser ignorada:
"Conheça todas as teorias, domine todas as técnicas, mas ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana."
Ou seja, ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana, sem recorrer a robôs.

"Elevar a qualidade de saúde de pessoas com idade avançada, que vivem sozinhas." oferecendo-lhe uma robô-enfermeira, eis a pretensão dos criadores da robô-enfermeira. Pretensão que leva-me a fazer as seguintes indagações. Será que pessoas nas condições citadas foram ouvidas pelos pesquisadores? Será que uma robô-enfermeira as tirará da condição de sozinhas? Será que elas saberão usar a robô? Será que elas prefeririam que lhes oferecessem uma companhia humana?

"Podemos estar há cinco ou seis anos de alcançar uma inteligência artificial mais 'humana'", projetou Goertzel. Há quantos anos podemos estar de "alcançar uma inteligência natural mais 'humana'", pergunto eu.

terça-feira, 27 de junho de 2023

Homem usa energia solar para consertar celular de graça no Centro

Paulista, descendente de japoneses, ele vive nas ruas do Rio há 9 anos: 'quero ajudar'

Ajudar as pessoas. Esse é o mantra de Mário Nishimura, de 44 anos, que está em situação de rua há nove anos. Descendente de japoneses, ele chama a atenção de quem passa em frente ao prédio do Ministério Público (MPRJ), no centro do Rio.
Ali, em meio a um carrinho com objetos pessoais, ele carrega três placas para captação de energia solar que ficam sobre uma estrutura improvisada de isopor, apontadas para o céu. Mário usa a energia gerada por elas para consertar, gratuitamente, celulares: - Consegui montar essa estrutura com a ajuda de um conhecido. Comprei essas placas de energia solar pela internet, a 33 dólares cada. Paguei com o meu dinheiro, mas pedi para que fosse entregue na casa dele. Só assim para conseguir fazer esses consertos, porque não tenho acesso a energia elétrica.
Natural de Santo André, Região Metropolitana de São Paulo, Mário sobrevive com benefício do governo federal. – Não é porque eu estou nessa situação que não goste ou não possa auxiliar. Consertar o celular pode custar muito caro, então, eu ajudo as pessoas. Fora isso, gosto de mexer com os aparelhos, me faz bem. Moro nas ruas desde que vim para o Rio, não consegui arranjar um emprego aqui – conta.
Ele aprendeu a mexer em celular através de tutoriais no You Tube, no próprio aparelho, que mantém conectado a uma das placas de energia solar. O acesso à internet é garantido por redes de wi-fi disponíveis na região.
Inspiração na luz de LED
Mário viveu no Japão, entre idas e vindas, de 1997 a 2008. Lá, trabalhou em uma fábrica desmontando portas, portões e janelas de alumínio. O fascínio pelos equipamentos elétricos e eletrônicos surgiu na primeira visita ao país, aos 18 anos, quando conheceu os painéis de luz de LED branca: - Essa tecnologia ainda não tinha chegado aqui no Brasil, fiquei impressionado.
De volta ao presente, ele conta que sonha com uma casa e um mundo melhor: - Espero sair das ruas, mas tudo será no tempo de Deus. É difícil arranjar trabalho, e não quero que me tratem mal. Às vezes recebo ofensas racistas, pessoas zombando da minha aparência. Desejo que esse país melhore e as pessoas também.
Esta é a íntegra de uma reportagem de Vittoria Alves publicada na edição de 05 de maio de 2023 do jornal Valor."
"Estimular as pessoas a opinarem sobre notícias que deveriam mexer conosco: as que podem contribuir para a melhoria da sociedade e as que podem contribuir para a 'pioria'", eis a intenção deste blog, pois "É preciso propagar as do primeiro tipo e desmascarar as do segundo". A publicação desta postagem está em conformidade com a intenção deste blog no que tange ao primeiro tipo de notícias: "as que podem contribuir para a melhoria da sociedade." Feito este preâmbulo vamos a algumas reflexões provocadas pela inspiradora reportagem de Vittoria Alves.
"Ajudar as pessoas. Esse é o mantra de Mário Nishimura, de 44 anos, que está em situação de rua há nove anos.", diz Vittoria Alves.
Mantra que uso para compará-lo com o de uma parcela considerável de indivíduos em situação não de rua, mas de prédios onde reúnem-se há sei lá quantos anos de mandatos como deputados, senadores ou vereadores. Mandatos usados para tramarem o melhor modo de praticarem o seu mantra: "Ferrar (para não usar um verbo mais contundente) as pessoas."
Mantra que considero representado em um sarcástico jargão usado por um personagem criado pelo genial Chico Anísio para representar, em um programa exibido entre janeiro de 1973 e abril de 1980, uma parcela considerável dos políticos brasileiros. Qual é o jargão? "Eu quero que pobre se exploda!". Sim, naquela época era proibido o uso de palavras mais contundentes em programas televisivos. Época em que, mesmo antes da fundação do Partido dos Trabalhadores (em 1980), os políticos já eram como são hoje.
Ou seja, diferentemente do que a grande mídia propaga, a existência de políticos dotados de falta de escrúpulos, de ausência de princípios morais e de sedução pela corrupção não é algo que, neste país, tenha surgido após a criação do PT, embora possa haver também nesse partido indivíduos dotados de tais qualidades. Não, qualidade não é algo apenas positivo. Existem também qualidades negativas, talvez até em quantidade maior do que as positivas, conforme sugere a qualidade da sociedade em que vivemos, considerando "que a qualidade de uma sociedade é resultado das ações de todos os seus componentes".
No meu entender, nenhum grupo constituído de seres humanos é integralmente bom nem integralmente mau. Até porque, individualmente, nenhum ser humano é integralmente bom nem integralmente mau. Sendo assim, creio que o que nos cabe é procurar fazer a devida distinção entre o que seja bom e o que seja mau, e feito isso, buscar colocar em prática aquilo que prestar. Como diz aquela recomendação atribuída a Paulo de Tarso: "Examinai tudo. Retende o que for bom." Recomendação que considero válida para toda e qualquer coisa que venhamos a fazer, inclusive a escolha dos políticos que nos representarão em termos de decidir o que seja melhor para a coletividade. Afinal, por mais incrível que possa parecer, é sobre isso que versa a tão alardeada democracia: governar em prol do interesse de todos, e não como se vê neste país em que o congresso é composto de bancadas encarregadas de defender interesses particulares em detrimento do bem comum.
"Mário sobrevive com benefício do governo federal.", diz Vittoria Alves.
Sobreviver, eis a palavra que descreve perfeitamente o que é possível fazer com o benefício do governo federal que Mário recebe. E ao usar o verbo sobreviver, Vittoria leva-me a fazer mais uma comparação. "Pralamentares, digo, parlamentares, vivem nababescamente com altas remunerações recebidas do governo federal acrescidas de uma infinidade de auxílios que deveriam ser vistos como autênticos deboches."
"– Não é porque eu estou nessa situação que não goste ou não possa auxiliar.", diz o próprio Mário Nishimura.
E tome comparações! "– Não é porque eu estou nessa situação que goste ou deva auxiliar.", eis o que imagino que diz uma parcela considerável dos políticos brasileiros.
"Às vezes recebo ofensas racistas, pessoas zombando da minha aparência.", diz Mário Nishimura."
"Nas vezes em que estou reunido com colegas de trabalho (sic) recebo o cerimonioso tratamento "Vossa Excelência", que, à luz da minha atuação como parlamentar, deveria soar como uma autêntica zombaria", eis o que deveria dizer uma parcela considerável dos políticos brasileiros.
"Desejo que esse país melhore e as pessoas também.", diz Mário Nishimura na última frase da instigante reportagem de Vittoria Alves.
Que o país em que vive melhore, eis um desejo que imagino ser da maioria das pessoas que nele vivem ou sobrevivem, e que dele não podem sair. O problema? Melhorar um país é algo para o qual só há um caminho: a melhora das pessoas que o integram. O problema? A melhora das pessoas é algo para o qual também só há um caminho: cada pessoa melhorar a si própria, pois a única maneira de conseguir mudar outra pessoa é por meio do nosso exemplo.
Exemplificar como agir de forma a tornar-se uma pessoa melhor, eis o que faz Mário Nishimura. Em um país em que a imensa maioria vive em conformidade com a indagação "O que é que eu ganho com isso?", o que faz Nishimura? Tendo "Ajudar as pessoas" como mantra, embora sobreviva com benefício do governo federal, ele sobrevive em conformidade com uma indagação diametralmente oposta: "O que é que as pessoas podem ganhar com o que eu faço?".
Em tempo: a postagem publicada em 08 de abril de 2023 no blog Espalhando ideias é intitulada "O que é que eu ganho com isso?".
 

 

quarta-feira, 21 de junho de 2023

EUA terão de produzir mais armas e munição

O Pentágono lançou uma revisão de seus estoques de armas, disse o oficial militar mais graduado dos EUA, indicando que Washington está se preparando para aumentar os gastos com armas por causa das preocupações com o impacto da guerra na Ucrânia no fornecimento de munições.
O general Mark Milley, presidente do Estado-Maior Conjunto, disse que os planejadores dos EUA foram forçados a reconsiderar suas suposições por causa do retorno das táticas de guerra terrestre do século 20, após duas décadas em que a doutrina foi moldada pelo combate à insurgência do Iraque e do Afeganistão.
"Uma das lições desta guerra é a que mostra o alto consumo de munições convencionais, e estamos reexaminando nossos próprios estoque e planos para garantir que acertemos", disse Milley ao jornal britânico "Financial Times". "E temos de pôr isso no orçamento. Munição é muito cara", afirmou.
Esta é a íntegra de uma notícia publicada na edição de 17 de fevereiro de 2023 do jornal Valor.
"EUA terão de produzir mais armas e munição", eis o titulo de uma notícia publicada na edição de 17 de fevereiro de 2023 do jornal Valor.
"Recebido por multidão, Trump fecha na Índia venda de US$ 3 bi em armas", eis o titulo de uma notícia publicada na edição de 24 de fevereiro de 2020 do jornal O Estado de S. Paulo.
"Os EUA já foram uma nação de consertadores, de inventores, de soldadores de fundo de quintal. Todo mundo sonhava em construir uma bicicleta melhor. Agora nossa única grande indústria é a guerra.", eis uma afirmação feita pelo escritor americano Nicholson Baker em uma reportagem-entrevista publicada na edição de 19-20 de setembro de 2004 do Jornal do Commercio.
"A pior coisa que fizemos foi colocar o dinheiro e o lucro em primeiro lugar, deixando as pessoas em segundo. É só recordarmos a falsa alegação de que o Iraque tinha armas de destruição em massa, o que levou à guerra. Ninguém estava preocupado em salvar pessoas, e sim dinheiro.", eis uma afirmação feita pelo cineasta francês Luc Besson em uma reportagem de Elaine Guerini, publicada na edição de 11 de agosto de 2017 do jornal Valor sob o sugestivo título Super-heróis contra o cinismo.
"Agora nossa única grande indústria é a guerra.", disse o escritor americano Nicholson Baker há quase vinte anos.
"É só recordarmos a falsa alegação de que o Iraque tinha armas de destruição em massa, o que levou à guerra. Ninguém estava preocupado em salvar pessoas, e sim dinheiro.", eis uma afirmação feita pelo cineasta francês Luc Besson há quase seis anos, em uma reportagem publicada sob o sugestivo título Super-heróis contra o cinismo.
"Os planejadores dos EUA foram forçados a reconsiderar suas suposições por causa do retorno das táticas de guerra terrestre do século 20, após duas décadas em que a doutrina foi moldada pelo combate à insurgência do Iraque e do Afeganistão", eis uma afirmação atribuída ao general Mark Milley, presidente do Estado-Maior Conjunto há quatro meses.
Considerando que a afirmação de que "a única grande indústria do EUA é a guerra" seja suficiente para validar a afirmação de "ninguém está preocupado em salvar pessoas, e sim dinheiro.", citada em uma reportagem sugestivamente intitulada Super-heróis contra o cinismo, será que faz sentido afirmar que, independentemente, de qualquer pretexto alegado na recente reportagem que provocou esta postagem, uma das grandes hipocrisias dos EUA é proclamaram-se os paladinos da paz neste planeta?

sexta-feira, 5 de maio de 2023

Por que o fim dos SUVs deveria ser regulamentado

Banir os carros enormes reduziria as emissões de gases e os acidentes

Cerca de 15 anos atrás, enquanto viajava por uma rodovia de oito pistas no Alabama, cercado por SUVs e caminhões, pensei: não vamos conseguir barrar as mudanças climáticas.
No ano passado, os SUVs responderam por um recorde de 46% das vendas mundiais de automóveis, segundo a Agência Internacional de Energia. Se quisermos ser sérios sobre manter o planeta habitável, temos de regulamentar e tributar os carros enormes até chegar à sua eliminação. Livrar-se dos carros enormes tem a ver com reduzir as emissões de gases de efeito estufa e com diminuir os acidentes de trânsito.
O número de SUVs em todo o mundo saltou quase sete vezes desde 2010, para cerca de 330 milhões. Dado que os SUVs consomem 20% de combustível a mais do que os carros de tamanho médio, hoje eles emitem três vezes mais carbono do que o Reino Unido. Os veículos de passageiros já respondem por cerca de 9% de todas as emissões do mundo. E a cada dia mais pessoas têm condições de arcar com a compra de um carro.
Os SUVs movidos a gasolina ainda superam em muito a chamada grande novidade das ruas, os veículos elétricos. Mesmo os SUVs elétricos terão muito pouco impacto em termos de prevenção das perigosas mudanças climáticas porque exigem baterias descomunais, dados seu volume e sua relativa ineficiência. E fabricar uma bateria de carro consome tanta energia quanto fabricar o próprio carro elétrico.
A segunda crítica contra os SUVs é que eles estão matando pessoas hoje. E são particularmente letais em sua terra de origem, os Estados Unidos, onde as mortes de pedestres cresceram entre 2010 e 2018. Enquanto isso, o número de mortes caiu em quase toda a Europa, onde os SUVs continuam a ser muito menos comuns.
Por causa de seu peso e da visibilidade limitada que oferecem aos motoristas, os SUVs protegem seus ocupantes ao mesmo tempo em que põem em perigo todas as outras pessoas e de forma muito trágica as crianças, atropeladas nas saídas de garagem por pais que não conseguem enxergá-las.
Os SUVs induzem a uma espécie de corrida armamentista: quando outros carros são enormes, as pessoas em carros pequenos se sentem inseguras e decidem ganhar volume também.
Em suma, precisamos usar a legislação para eliminar os carros enormes, como o caminhão da série F da Ford, o veículo de passageiros mais vendido nos EUA por 41 anos seguidos. Afinal, nós proibimos outras substâncias perigosas, e às vezes nem tão perigosas, como a maconha.
É verdade que eliminá-los via regulamentações seria uma restrição à liberdade. Mas, mesmo com carros menores, as pessoas ainda poderão dirigir para onde quiserem, com a mesma rapidez. (Tradução de Lilian Carmona)
Esta é a íntegra de um artigo de Simon Kuper, do Financial Times, publicado na edição de 31 de março de 2023 do jornal Valor em seu suplemento intitulado "EU& Fim de Semana".
"Se quisermos ser sérios sobre manter o planeta habitável, temos de regulamentar e tributar os carros enormes até chegar à sua eliminação. Livrar-se dos carros enormes tem a ver com reduzir as emissões de gases de efeito estufa e com diminuir os acidentes de trânsito.", diz Simon Kuper.
"Ser sérios sobre manter o planeta habitável", eis algo que não consta nas cogitações daqueles que possuem condições financeiras para comprar um SUV (Sport Utility Vehicle), ou seja, um veículo utilitário esportivo. Um veículo utilitário que, ironicamente, está incluído entre as coisas que muito contribuem para tornar este planeta inútil em termos de morada para os integrantes da autodenominada espécie inteligente do universo.
"Mesmo os SUVs elétricos terão muito pouco impacto em termos de prevenção das perigosas mudanças climáticas porque exigem baterias descomunais, dados seu volume e sua relativa ineficiência. E fabricar uma bateria de carro consome tanta energia quanto fabricar o próprio carro elétrico."
Consumir tanta energia para fabricar a bateria quanto para fabricar o próprio carro! É impressionante a desfaçatez com que são apregoados apenas os benefícios proporcionados por alguma grande novidade sem fazer qualquer menção aos malefícios por ela trazidos.
"SUVs protegem seus ocupantes ao mesmo tempo em que põem em perigo todas as outras pessoas e de forma muito trágica as crianças, atropeladas nas saídas de garagem por pais que não conseguem enxergá-las."
"Proteger seus ocupantes ao mesmo tempo em que põe em perigo todas as outras pessoas". Será que o que essa afirmação descreve é algo proporcionado apenas por um SUV? Será que ela abrange também uma residência situada em um condomínio fechado à entrada dos "diferentes" daqueles que nele residem? Será que ela é aplicável também no que tange a colégios e a clubes particulares?
Enfim, será que "Proteger seus ocupantes ao mesmo tempo em que põe em perigo todas as outras pessoas" é uma afirmação que pode ser enxergada como a descrição de um recôndito desejo de todo e qualquer indivíduo desprovido do senso de coletividade expresso em uma afirmação atribuída ao imperador filósofo Marco Aurélio: "O que não convém ao enxame não convém tampouco à abelha".
"(...) E de forma muito trágica as crianças, atropeladas nas saídas de garagem por pais que não conseguem enxergá-las."
Matar pessoas por não conseguir enxergá-las, eis algo que enxergo como indo além das mortes de crianças por atropelamentos envolvendo SUVs. Matar pessoas pelo desinteresse em enxergá-las como seres que assim como nós têm direito à vida é, no meu entender, outra forma de matar pessoas por não conseguir enxergá-las. Vocês também entendem assim?
"Os SUVs induzem a uma espécie de corrida armamentista: quando outros carros são enormes, as pessoas em carros pequenos se sentem inseguras e decidem ganhar volume também."
"Induzir a uma espécie de corrida armamentista", eis mais uma afirmação bastante pertinente sobre os efeitos do aumento da quantidade de SUVs em todo o mundo. Até porque, considerando a quantidade de mortes causadas por acidentes envolvendo SUVs, considerá-lo uma arma é algo que, no meu entender, está repleto de sentido.
"Em suma, precisamos usar a legislação para eliminar os carros enormes, (...) É verdade que eliminá-los via regulamentações seria uma restrição à liberdade. Mas, mesmo com carros menores, as pessoas ainda poderão dirigir para onde quiserem, com a mesma rapidez."
"É verdade que eliminá-los via regulamentações seria uma restrição à liberdade.", diz Simon Kuper. Mas a qual liberdade tal restrição atingiria? Não, não seria a de 'dirigir para onde as pessoas quiserem, com a mesma rapidez', pois isso é algo que pode, perfeitamente, continuar sendo feito, 'mesmo com carros menores'.
Então, qual liberdade seria restringida? A liberdade de sair por aí libertos da "seriedade sobre manter o planeta habitável" (expressão usada por Kuper no segundo parágrafo de seu excelente artigo). Ou seja, a liberdade de sair por aí contribuindo para a eliminação da habitabilidade do planeta.
Portanto, no meu entender, entre a "verdade que eliminar os carros enormes via regulamentação seria uma restrição à liberdade" e a verdade que não eliminá-los será uma restrição à liberdade de continuar vivendo neste planeta, por ele ter sido tornado inabitável, a escolha deve ser pela segunda verdade citada nesta frase.
"Em suma, precisamos usar a legislação para eliminar os carros enormes, (...) Afinal, nós proibimos outras substâncias perigosas, e às vezes nem tão perigosas, como a maconha.", diz Simon Kuper no penúltimo parágrafo de seu artigo.
"Em suma, precisamos usar a legislação para eliminar os carros enormes, (...) Afinal, será que faz algum sentido denominar restrição à liberdade a eliminação de algo cujo uso por uma parte da população produz efeitos comprovadamente maléficos para todo o planeta? - pergunto eu, encerrando esta postagem provocada pela leitura do instigante artigo de Simon Kuper.